Fios de Prata
Raphael Draccon
Leya
★
Mas vamos ao que interessa.
Quando vi esse livro na livraria tive basicamente duas reações. A primeira foi achar a capa e o título maravilhosos. A segunda foi soltar um suspiro cansado, olhar para o céu e perguntar mentalmente, por quê?, quando percebi que o livro era do Draccon.
Sei que isso soa meio cruel e preconceituoso, mas já comprei um livro do Draccon, Dragões de Éter, e nunca consegui passar da página cem porque onomatopeias, caps lock, quebra da fourth wall e diálogos pra lá de desajeitados não são características que eu aprecio em livro algum. E a própria narrativa me pareceu infantil demais, então deixei a história, que até parecia bastante interessante, pra lá. Acho que fica fácil imaginar porque desanimei tanto ao ver que Fios de Prata era do mesmo autor deDragões de Éter. A ideia me pareceu excelente, mas meu sexto sentido apitando loucamente não deixou que eu comprasse o livro da primeira vez que o vi.
Lá pela vigésima vez, desisti e o comprei.
Foi a última vez em que não confiei em meu sexto sentido.
(Mentira, teve O Trono de Vidro que veio depois, mas só).
Primeiro, tenho uma confissão a fazer: nunca li Sandman. Ou qualquer outra coisa do Neil Gaiman, pra falar a verdade. Pretendo o fazer um dia, mas acho que por ter colocado Gaiman e Stephen King no mesmo nível de fama/credibilidade (por motivos que eu mesma desconheço), depois de ter me decepcionado com um livro do King minha vontade de ler algo do Gaiman morreu. Sei que é uma razão estúpida, mas foi o que aconteceu. Sendo bem sincera, fico meio receosa de ler autores muito consagrados porque acabo indo com muitas expectativas e quebrando a cara, e meio que já li livros ruins demais esse ano e não preciso odiar outro livro amado por todos, muito obrigada.
(E aparentemente Sandman é HQ???? Menos chances ainda de eu ler um dia, plep).
Mas enfim, Fios de Prata começou muito bem, para surpresa minha e das minhas amigas, com quem sempre compartilho minhas opiniões sobre livros que estou lendo. As descrições eram boas e o ritmo também, e apesar dos diálogos desajeitados (de novo), eu estava disposta a perdoar defeitos menores em prol da ideia de gostar de um livro de fantasia nacional (also, se você não perdoar diálogos desajeitados não vai gostar de livro de fantasia brasileiro nenhum, porque juro que essa é a falha mais comum de todos eles). Mas minha alegrai foi curta; não demorou muito e o livro começou a desandar.
Causa número um: os personagens. São péssimos, sem mais. Ocos, sem profundidade, estereótipos puros sem a menor tentativa de originalidade ou até mesmo verossimilhança. Ariana é gaúcha, então claro que tivemos gírias gaúchas em cada frase dita pela moça, mas a "gaúchisse" dela começou e acabou aí. Ela é uma ginasta de personalidade forte, o que basicamente quer dizer que ela solta umas respostas de vez em quando, mas só. Ela acaba presa no mundo dos sonhos e nosso herói, Mikael Santiago, ou Allejo, tem como missão resgatá-la. Fazer uma pseudo-personagem feminina forte apenas para tê-la sendo salva pelo homem protagonista, hm? Por que isso não me surpreende?
O Allejo então, nem se fala. Jogador de futebol, rico, pegador, conhecedor de cultura nerd e uma boa pessoa. Tem a profundidade de uma poça no meio da estrada, e é tão ignorável quanto uma. Um Gary Stu em toda sua glória. Blah.
O resto dos personagens é tão marcante que não consigo lembrar do nome deles. Oops.
Causa número dois: o romance. Senhoras e senhores, bem vindos ao reino do insta-love, ou, para os marinheiros de primeira viagem que não costumam ler livros com muito romance, o amor instantâneo aka o melhor modo de fazer os dois pombinhos se apaixonarem sem se preocupar com coisas inúteis como desenvolvimento do relacionamento ou dos personagens. E vocês pensando que insta-love pertencia só aos "livros para garotas", hm? (O Poder da Espada, eu estou olhando para você.)
A cena que mais me marcou do relacionamento de Ariana e Allejo foi o momento em que ele se apaixonou por ela, numa cena em que ela se apresentava em alguma competição. Como se esquecer de Allejo babando nas características físicas de Ariana e se declarando apaixonado após vê-la executar um monte de saltos com nomes complicados (obviamente o autor teve que colocar os nomes deles lá, e também mencionar o quão difícil eles são)? Pra que se apaixonar após meses (ou anos) de convivência se você pode cair de amores por alguém depois de vê-los fazer um salto duplo carpado, já que se apaixonar assim custa bem menos desenvolvimento de personagem e página?
Mas pode continuar babando pela Ariana, Allejo. Eu ficarei aqui, encarando o seu relacionamento com ela (a maior causa da história existir, falando nisso), mais ou menos assim:
Mas, como eu disse, pode continuar :)
Causa número três: a escrita que, sim, começou ótima, deu alguns saltos carpados incríveis, mas terminou estatelada no chão com as pernas pra cima. Um desastre.
Sabe que Fios de Prata me lembra uma versão brasileira de A Lâmina na Alma? Não, as histórias não são nada parecidas, mas ambas as histórias compartilham uma coisa: a vontade ferrenha (lê-se desespero) de ser épica. Ou seja, usam purple prose o tempo todo.
Eu pude sentir esse livro tentando me convencer de que ele era a coisa mais épica da Terra. Ele tentou, e tentou muito. Houve longas descrições cheias de floreios, inúmeras referências à cultura pop, uma tentativa (que foi se tornando cada vez mais desesperada à medida que o livro ia se aproximando do fim) de mostrar que aquela era uma guerra que atingia a todos e influenciava a todos (e que por isso, obviamente, era tão, mas tão importante) e passagens feitas simplesmente para servir de quote, de tão forçadas e wtf que foram.
Como eu já disse, um desastre.
Causa número quatro: o final. Um final com um senhor deux ex machina, vale frisar.
Acho que o Draccon pensou que o deux ex machina soaria como um plot twist, mas esse não foi, nem de longe, o caso. Veja bem, não havia modo algum de as coisas se resolverem do jeito que elas estavam, então algo teve que surgir do nada para dar um fim à história. Basicamente um "epa não sei como concluir isso usando as coisas que foram apresentadas durante o livro, então vou ter que pegar isso aqui, algo quase sem relação alguma com tudo que aconteceu, e usar para resolver tudo. Genial!"
Mas eu ri, porque o final foi meio de desenho animado e porque eu gostei de ver alguns personagens quebrarem a cara lindamente. Mas sim, foi um deux ex machina. Ha.
Parei de ler Os Dragões de Éter porque o estilo não me agradou, mas lá cheguei a considerar a escrita do autor boa (apenas não meu tipo de escrita, saca). Fios de Prata, porém, me traumatizou demais para que eu volte sequer a considerar comprar um livro dele. Nem rola. Isso é um adeus, feliz ou infelizmente.
A única coisa boa desse livro foi o Phantasos, e não, não foi porque ele é um bom personagem. Mas tinha elfos no reino dele, so yay, call me biased, mas eu tinha que me apegar a algo bom no meio dessa bagunça. Anyway, uma estrela para Fios de Prata.
(Se eu sei que estou provavelmente destruindo minhas chances de ser publicada aqui no Brasil com essa resenha? Ô se sei, mas, obviamente, não me importo. Tsk).
Raphael Draccon
Leya
★
Mikael Santiago realizou o sonho de milhares de garotos. Aos 22 anos era o jogador brasileiro com o passe mais caro da história do futebol. Mas à noite os sonhos o amendrontavam. Às vezes, o que está por trás de um simples sonho – ou pesadelo – é muito maior que um desejo inconsciente. Há séculos, Madelein, atual madrinha das nove filhas de Zeus, tornou-se senhora de um condado no Sonhar, responsável por estimular os sonhos despertos dos mortais. Uma jogada ambiciosa que acaba por iniciar uma guerra épica envolvendo os três deuses Morpheus, Phantasos e Phobetor, traz desordem a todo o planeta Terra e ameaça os fios de prata de mais de sete bilhões de sonhadores terrestres. Envolvido em meio a sonhos lúcidos e viagens astrais perigosas, a busca de Mikael pelo espírito da mulher amada, entretanto, torna-se peça fundamental em meio a uma guerra onírica. E coloca a prova sua promessa de ir até o inferno por sua amada.Li esse livro ano passado e já fiz uma resenha para meu tumblr há algum tempo, mas sinto que preciso de uma nova e mais detalhada agora. Plus, estou tão gripada que meus olhos ardem e respirar dói, e para completar coloquei aparelho ontem e no momento quero arrancar todos os meus dentes de tão nervosa que esse treco me faz ficar, com o bônus sendo que mal posso comer e isso está me levando lentamente à loucura/consideração de pensamentos assassinos. Então, sim, preciso extravasar toda a irritação que estou sentindo ou realmente acabarei matando alguém, esse alguém sendo muito provavelmente meu irmão, que vem reclamando de um bug em World of Warcraft no meu pé do ouvido desde domingo quando ele sabe muito bem que eu odeio World of Warcraft!!!!
Mas vamos ao que interessa.
Quando vi esse livro na livraria tive basicamente duas reações. A primeira foi achar a capa e o título maravilhosos. A segunda foi soltar um suspiro cansado, olhar para o céu e perguntar mentalmente, por quê?, quando percebi que o livro era do Draccon.
Sei que isso soa meio cruel e preconceituoso, mas já comprei um livro do Draccon, Dragões de Éter, e nunca consegui passar da página cem porque onomatopeias, caps lock, quebra da fourth wall e diálogos pra lá de desajeitados não são características que eu aprecio em livro algum. E a própria narrativa me pareceu infantil demais, então deixei a história, que até parecia bastante interessante, pra lá. Acho que fica fácil imaginar porque desanimei tanto ao ver que Fios de Prata era do mesmo autor deDragões de Éter. A ideia me pareceu excelente, mas meu sexto sentido apitando loucamente não deixou que eu comprasse o livro da primeira vez que o vi.
Lá pela vigésima vez, desisti e o comprei.
Foi a última vez em que não confiei em meu sexto sentido.
(Mentira, teve O Trono de Vidro que veio depois, mas só).
Primeiro, tenho uma confissão a fazer: nunca li Sandman. Ou qualquer outra coisa do Neil Gaiman, pra falar a verdade. Pretendo o fazer um dia, mas acho que por ter colocado Gaiman e Stephen King no mesmo nível de fama/credibilidade (por motivos que eu mesma desconheço), depois de ter me decepcionado com um livro do King minha vontade de ler algo do Gaiman morreu. Sei que é uma razão estúpida, mas foi o que aconteceu. Sendo bem sincera, fico meio receosa de ler autores muito consagrados porque acabo indo com muitas expectativas e quebrando a cara, e meio que já li livros ruins demais esse ano e não preciso odiar outro livro amado por todos, muito obrigada.
(E aparentemente Sandman é HQ???? Menos chances ainda de eu ler um dia, plep).
Mas enfim, Fios de Prata começou muito bem, para surpresa minha e das minhas amigas, com quem sempre compartilho minhas opiniões sobre livros que estou lendo. As descrições eram boas e o ritmo também, e apesar dos diálogos desajeitados (de novo), eu estava disposta a perdoar defeitos menores em prol da ideia de gostar de um livro de fantasia nacional (also, se você não perdoar diálogos desajeitados não vai gostar de livro de fantasia brasileiro nenhum, porque juro que essa é a falha mais comum de todos eles). Mas minha alegrai foi curta; não demorou muito e o livro começou a desandar.
Causa número um: os personagens. São péssimos, sem mais. Ocos, sem profundidade, estereótipos puros sem a menor tentativa de originalidade ou até mesmo verossimilhança. Ariana é gaúcha, então claro que tivemos gírias gaúchas em cada frase dita pela moça, mas a "gaúchisse" dela começou e acabou aí. Ela é uma ginasta de personalidade forte, o que basicamente quer dizer que ela solta umas respostas de vez em quando, mas só. Ela acaba presa no mundo dos sonhos e nosso herói, Mikael Santiago, ou Allejo, tem como missão resgatá-la. Fazer uma pseudo-personagem feminina forte apenas para tê-la sendo salva pelo homem protagonista, hm? Por que isso não me surpreende?
O Allejo então, nem se fala. Jogador de futebol, rico, pegador, conhecedor de cultura nerd e uma boa pessoa. Tem a profundidade de uma poça no meio da estrada, e é tão ignorável quanto uma. Um Gary Stu em toda sua glória. Blah.
O resto dos personagens é tão marcante que não consigo lembrar do nome deles. Oops.
Causa número dois: o romance. Senhoras e senhores, bem vindos ao reino do insta-love, ou, para os marinheiros de primeira viagem que não costumam ler livros com muito romance, o amor instantâneo aka o melhor modo de fazer os dois pombinhos se apaixonarem sem se preocupar com coisas inúteis como desenvolvimento do relacionamento ou dos personagens. E vocês pensando que insta-love pertencia só aos "livros para garotas", hm? (O Poder da Espada, eu estou olhando para você.)
A cena que mais me marcou do relacionamento de Ariana e Allejo foi o momento em que ele se apaixonou por ela, numa cena em que ela se apresentava em alguma competição. Como se esquecer de Allejo babando nas características físicas de Ariana e se declarando apaixonado após vê-la executar um monte de saltos com nomes complicados (obviamente o autor teve que colocar os nomes deles lá, e também mencionar o quão difícil eles são)? Pra que se apaixonar após meses (ou anos) de convivência se você pode cair de amores por alguém depois de vê-los fazer um salto duplo carpado, já que se apaixonar assim custa bem menos desenvolvimento de personagem e página?
Mas pode continuar babando pela Ariana, Allejo. Eu ficarei aqui, encarando o seu relacionamento com ela (a maior causa da história existir, falando nisso), mais ou menos assim:
Mas, como eu disse, pode continuar :)
Causa número três: a escrita que, sim, começou ótima, deu alguns saltos carpados incríveis, mas terminou estatelada no chão com as pernas pra cima. Um desastre.
Sabe que Fios de Prata me lembra uma versão brasileira de A Lâmina na Alma? Não, as histórias não são nada parecidas, mas ambas as histórias compartilham uma coisa: a vontade ferrenha (lê-se desespero) de ser épica. Ou seja, usam purple prose o tempo todo.
Eu pude sentir esse livro tentando me convencer de que ele era a coisa mais épica da Terra. Ele tentou, e tentou muito. Houve longas descrições cheias de floreios, inúmeras referências à cultura pop, uma tentativa (que foi se tornando cada vez mais desesperada à medida que o livro ia se aproximando do fim) de mostrar que aquela era uma guerra que atingia a todos e influenciava a todos (e que por isso, obviamente, era tão, mas tão importante) e passagens feitas simplesmente para servir de quote, de tão forçadas e wtf que foram.
Como eu já disse, um desastre.
Causa número quatro: o final. Um final com um senhor deux ex machina, vale frisar.
Acho que o Draccon pensou que o deux ex machina soaria como um plot twist, mas esse não foi, nem de longe, o caso. Veja bem, não havia modo algum de as coisas se resolverem do jeito que elas estavam, então algo teve que surgir do nada para dar um fim à história. Basicamente um "epa não sei como concluir isso usando as coisas que foram apresentadas durante o livro, então vou ter que pegar isso aqui, algo quase sem relação alguma com tudo que aconteceu, e usar para resolver tudo. Genial!"
Mas eu ri, porque o final foi meio de desenho animado e porque eu gostei de ver alguns personagens quebrarem a cara lindamente. Mas sim, foi um deux ex machina. Ha.
Parei de ler Os Dragões de Éter porque o estilo não me agradou, mas lá cheguei a considerar a escrita do autor boa (apenas não meu tipo de escrita, saca). Fios de Prata, porém, me traumatizou demais para que eu volte sequer a considerar comprar um livro dele. Nem rola. Isso é um adeus, feliz ou infelizmente.
A única coisa boa desse livro foi o Phantasos, e não, não foi porque ele é um bom personagem. Mas tinha elfos no reino dele, so yay, call me biased, mas eu tinha que me apegar a algo bom no meio dessa bagunça. Anyway, uma estrela para Fios de Prata.
(Se eu sei que estou provavelmente destruindo minhas chances de ser publicada aqui no Brasil com essa resenha? Ô se sei, mas, obviamente, não me importo. Tsk).
2 comentários
Olá, Lynx! Eu li a série Sandman, do Neil Gaiman, e tenho um horror enorme de ver essa maravilhosa trama estragada pela péssima escrita do Raphael. O pior é perceber que o Raphael tem talento e não sabe ou não quer usar. Li Espíritos de Gelo e diversas vezes me irritou ver como ele se limita e como isso acaba funcionando contra o trabalho. Por isso não procuro outros trabalhos dele para ler. Dragões de Éter já ensaiei ler várias vezes, começo e não consigo continuar, e nem é por causa do público-alvo, mas a escrita mesmo.
ResponderExcluirAdorei a resenha. Bjos!
Tenho muita vontade de ler Sandman (mas é HQ, e HQ não é muito minha praia :/), e sempre ouvi falar muito bem, então quando comecei Fios de Prata estava esperando algo no mínimo interessante (apesar do autor, uh). E sim, ele parece ter talento mesmo, mas acaba se perdendo ao tentar dar uma voz para a história, tanto aqui em Fios de Prata quanto em Dragões de Éter. Já até considerei a ideia de ele não tentar melhorar justamente porque o que ele mostrou até agora funcionou muito bem; ele tem muitos fãs, vende bem e é um dos maiores nomes da fantasia nacional, afinal de contas. Pena que a escrita dele simplesmente não funciona pra mim.
ResponderExcluirObrigada!